O esporte não é ficção
Os prisioneiros soviéticos que venceram os soldados nazistas em uma partida de futebol em 1942, mesmo sob ameaças de consequências fatais. Tommie Smith e John Carlos, atletas responsáveis por um dos momentos mais marcantes da história esportiva, quando levantaram seus braços na entrega das medalhas do atletismo nas Olimpíadas do México em 1968, em referência à luta dos Panteras Negras pelos direitos civis dos negros nos EUA. O Santos de Pelé que parou uma guerra na Nigéria em 1969. A união respeitosa de atletas das duas Coreias nas Olímpiadas de Inverno em 2018. A luta do início do século XX para integrar os negros ao futebol. Como se percebe, o esporte não é ficção. Ele não acontece em Marte ou na Lua. É um elemento da realidade concreta, produto de relações sociais complexas e fator de integração e união para a sociedade. Não, não é mero entretenimento. Todo apaixonado por algum esporte e torcedor de algum time/atleta sabe e reconhece que há mil coisas entre o céu e a terra quando se fala de esporte. Envolve representação, projeção social, identidades históricas, sentimentos coletivos e também aprendizados. O esporte pode dar ressaca, tanto a da vitória quanto a da derrota. O esporte estende as problemáticas da sociedade, não fica imune a nada. Queira ou não queira, ele é produzido também politicamente, por instituições capazes de reconfigurar o cotidiano de uma cidade e um país. Não é controlado pelos políticos de um Congresso Nacional – apesar da possibilidade de interferências –, mas é feito por pessoas de carne e osso que, simplesmente, não estão ali somente para entreter o público. O esporte tem potencial transformador, agregador. Num país como o Brasil, muitas vezes preenche um pouco do vazio de um frágil sistema educacional. Ensina valores a crianças, jovens, adultos e idosos. Não, o esporte não precisa ficar imune a nada. O esporte tem que simplesmente existir. Pra nos divertir, pra nos entristecer, pra escancarar nossos problemas e também para nos ajudar a resolvê-los. Por isso, o Joga de Terno discorda do texto “Evento esportivo não é lugar de manifestação política” – assinado pelo jornalista Tiago Leifert –, que hoje circula e repercute nas redes sociais. Foto: Acervo O Globo